Ìris, mensageira do Olimpo. Filha de Taumas, deus do mar, e Electra, uma Oceânide, ninfa dos oceanos, ela é responsável por comunicar aos homens as mensagens enviadas pelos Deuses. Na sua viagem entre o céu e a terra é seguida por um rasto de muitas cores e por isso é também reconhecida como a personificação do arco-íris. Esta personagem da mitologia grega e a sua lenda servem aqui de introdução pelo encontro que é possível estabelecer entre si e os conceitos explorados neste ensaio: o olho – representado pela deusa Íris e termo que designa a parte colorida deste órgão –, o estímulo – simbolizado pelo arco-íris que a sucede –, a sensação – que corresponde à mensagem que é transportada entre o céu e a terra –, a percepção – que se traduz na interpretação da mensagem pelo Homem –, e por último, a água – a origem da deusa, enquanto descendente de Taumas e Electra. Ao mesmo tempo, porque nos pareceu que não seria de maneira nenhuma estranho acreditar que o mito desta personagem pudesse ter servido como referência para o Paulo Mariz, uma vez que este processo de pesquisa transdisciplinar e de citação é uma característica da sua obra e trabalho gráfico. Podemos compreendê-lo neste ensaio em que esse modo de fazer é matriz para uma experiência perceptiva. Num percurso que nos conduz invariavelmente pelos três estados da água – sólido, gasoso e líquido –, da gruta da nascente ao fundo do mar, entre cenários naturais e artificiais, somos instigados a questionar sobre aquilo para que olhamos e a procurar entender porque é que certas imagens incitam a dúvida, enquanto que outras são de imediata apreensão. De que maneira o olho e o estímulo dos receptores sensoriais influenciam a nossa percepção? Ou quão dependente é esta ferramenta anatómica da memória, da experiência e do conhecimento adquirido? Que interpretações podem ser feitas a partir de uma mesma imagem quando apenas ela nos auxilia e contextualiza?
Each Eye Reflects Its Own Rainbow é um mapa construído a partir de imagens, desenhos e mensagens. Estas últimas, surgem em quatro momentos do ensaio para evocar a ciclicidade e a ambiguidade das formas e lugares que vemos reproduzidos e criados. As páginas que as precedem e sucedem são planeadas de forma precisa a partir de uma colecção de imagens em domínio público, recolhidas em diversas plataformas online. Algumas delas são utilizadas como enunciado para o decalque dos desenhos criados a partir da sobreposição de papel químico. Neste mapa encontramos visualidades concretas e tangíveis. Representações vagas e equívocas. A certo momento deixa de ser possível afirmar que aquilo que vemos é, de facto, água ou algo relacionável. Pelo contrário, questionamo-nos se tais imagens se poderão tratar de outros elementos naturais ou biológicos, se são representações de formas simuladas ou orgânicas, se realidade ou ficção. Outros aspectos como a escala – macro, micro, nano –, ou o movimento e inércia das formas deixam também de ser legíveis. A narrativa cria em nós incerteza e suspeita. Quantas vezes teremos sido iludidos pela nossa percepção? O que desconhecemos sobre aquilo que achávamos saber tanto?
Em conversa, o Paulo conta-nos que lhe perguntaram: “– O que é para ti a água?”. Pareceu pertinente retomar a questão para este texto porque ela expõe a dimensão simbólica intrínseca ao ensaio e revela como este é também um exercício que o autor cria para si mesmo. Para alguém que nasceu numa cidade próxima do mar e para quem essa herança continua a estar muito presente, explorar e questionar aquilo que sempre conheceu, procurando encontrar aí novos lugares, significados e imagens, lembra como tudo contém em si naturezas que desconhecemos.
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